Nem só as telas comprometem a saúde dos adolescentes
Reduções no consumo de álcool e tabaco e avanço da escolaridade se contrapõem ao crescimento da obesidade e dos transtornos mentais; ‘A adolescência não pode mais ser ignorada’, pedem pesquisadores da Lancet.
A adolescência tem sido vista como a fase “mais saudável da vida”, situada entre os perigos agudos de morte prematura da infância e das doenças crônicas associadas ao envelhecimento.
Mas, para pesquisadores de vários países, integrantes da Comissão de Saúde e Bem-Estar de Adolescentes da respeitada revista científica The Lancet, essa visão precisa mudar: a adolescência deve ser entendida como um momento chave para garantir a saúde dos futuros adultos e das próximas gerações.
O problema é que, hoje, o bem-estar desse grupo parece ter chegado a um ponto crítico.
Um extenso relatório foi publicado pela comissão na última terça-feira, 20. No documento, os cientistas frisam que os adolescentes de hoje “enfrentam, desproporcionalmente, ameaças emergentes à saúde global”.
A disparada da obesidade, as taxas crescentes de transtornos mentais, as mudanças climáticas e a degradação ambiental, somada à rápida urbanização, além do poder de influências comerciais na saúde — com a indústria do tabaco incentivando o uso de vapes e as empresas alimentícias promovendo os produtos ultraprocessados, são o que mais preocupam os cientistas.
São questões que vão muito além da introdução de smartphones e redes sociais na rotina — que, por vezes, parece ser o único fator levantado na discussão pública sobre o tema.
É verdade que, nas últimas décadas, alguns indicadores de saúde desse grupo até melhoraram: foram registradas reduções no uso de tabaco e álcool e progressos em relação à escolaridade e à diminuição da subnutrição, por exemplo. Só que essa evolução foi desigual. “Houve avanço, mas aquém do desejado em nível global”. Hoje, o que preocupa é a obesidade, causada pelo consumo excessivo de açúcares e ultraprocessados.
Embora os adolescentes representem mais de um quarto da população e carreguem uma carga desproporcional do ônus global das doenças (9,1%) – conceito que abrange tanto mortalidade como perda de qualidade de vida por incapacidade –, eles receberam apenas 2,4% da assistência ao desenvolvimento para a saúde entre 2016 e 2021. Para cada US$ 1 investido, apenas US$ 0,02 vão para a saúde de adolescentes.
As mudanças climáticas também preocupam. Eles serão, frisam os especialistas, “a primeira geração que viverá toda sua vida em um mundo onde a temperatura média anual global tem sido consistentemente 0,5°C mais alta do que os níveis pré-industriais.
Segundo a comissão da Lancet, os transtornos mentais são a principal causa de perda de anos de vida saudáveis entre adolescentes atualmente e parecem influenciar fortemente diversos desfechos ao longo da vida adulta – como saúde física, uso de substâncias, relações interpessoais, educação e emprego.
A adolescência não pode mais ser ignorada, e os investimentos feitos para garantir a saúde e o bem-estar dessa geração de adolescentes são uma das melhores estratégias para assegurar o futuro da humanidade e do planeta.
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